16.11.06

Será que ainda posso usar calças com buracos?! III

Aquela manhã de trabalho foi produtiva e correu bem, mas acabou por passar a tarde toda na rua e a noite apresentava-se como cheia de trabalho. “Não faz mal, gosto de trabalhar à noite, isto num instante está acabado e pronto, amanhã é entregar e fica despachado.” – Pensou Joana enquanto se sentava ao computador.
Voltou a levantar-se. A camisola arrancada num instante, as calças de ganga espalhadas pelo chão do quarto. Enfiar o pijama, os chinelos, o cabelo solto. A certeza de que iria encontrar o Diogo no dia seguinte trazia-lhe uma tranquilidade que encorajava a trabalhar.
Afinal, aquilo não era tão mau quanto parecia, estava a ganhar outra cor, acrescentar mais umas médias, mais umas comparações com estudos teóricos: “Tens que procurar os pontos fortes para os salientares e identificar os pontos fracos para te prevenires” – Dissera-lhe Diogo naquela manhã. “E confia no teu trabalho!” – Esta tranquilidade fascinava Joana. Seria assim que ele exercia aquele encantamento sobre ela? Salientando os seus pontos fortes e conhecendo os pontos fracos…Já não lhe acontecia há muito, ficar sem palavras…Diogo tinha esse poder, de a deixar sem resposta, de lhe fazer perder o olhar…O caminho que estavam a tomar era muito perigoso, mas há muito que Joana deixará de o conseguir evitar. Tinha prometido a ela própria que não iria dar nome aos sentimentos que cresciam dentro dela. Mas até quando seria capaz de lhes fugir? Disfarçá-los começava a ser difícil…
Uma luz cor-de-laranja a piscar no monitor arrancou-a dos seus pensamentos. Era a sobrinha Rute ali, à distância de um click, ansiosa por contar as novidades de uma conversa telefónica com o Fábio: - “Ele ligou-me de Espanha e eu sempre a dar-lhe aquele desprezo, mesmo “bué”, mas ele gastou mesmo “bué” dinheiro, não tas bem a ver…” – Joana adorava aquela miúda, era a sua princesinha, já lhe tinha aturado as maiores loucuras, já lhe tinha limpo milhares de lágrimas, já tinham estado zangadas e separadas, mas aquela relação nunca mudava, mais pareciam as melhoras amigas, irmãs.
Mais uma luzinha a piscar.
“Olha lá, utilizo o coeficiente de Pearson ou o de Spearman?!” – Perguntou Eduardo, descontraído.
“Depende do que queres fazer, o de Pearson é mais usual, mas se não for significativo utiliza o de Spearman e assim esgotas todas as possibilidades” – Carregou Joana.
“Brigada” – Agradeceu Eduardo.
“Precisas de ajuda” – Hesitou Joana.
“Se precisar eu digo” – Foi rápido na resposta, Eduardo.
“Ok”. – Terminou Joana.
E mais uma luzinha a piscar. Era finalmente Diogo. E ali a conversa correu solta, entre cores, sonhos, aromas e desejos. Aquelas conversas eram deliciosas, mágicas…Joana já tinha tentado evitá-las por diversas vezes, mas a frieza que procurava a todo o custo impor às suas palavras tornava-se demasiado dolorosa para ambos. O que era aquilo que se estava a passar entre ambos?! Por mais errado que lhe parecesse, Joana confortava-se com a ideia de que tinha voltado a sorrir…
(continua)

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